Proust e Nabokov: pintura escrita [The translated
title of Daniel Piza's article is "Proust and Nabokov: written
painting"]
Livros analisam a presença e a importância das artes plásticas na
obra dos dois gênios da palavra
Literatura e pintura sempre foram consanguíneas. Desde Dante, que
fez dos círculos do inferno e paraíso uma série de afrescos como os de
Giotto, até John Updike, que chegou a dizer que um bom ficcionista
precisa saber desenhar, a ligação entre essas duas artes sempre foi
forte.[...] Outro excelente livro sobre o tema, The Sublime Artist's
Studio - Nabokov and Painting (Northwestern University Press), do
crítico literário Gavriel Shapiro, acaba de ser lançado. Mas aqui não
se trata de um catálogo, mas de um estudo sobre a história da pintura
na literatura de Vladimir Nabokov (1899-1977), o autor de Lolita, Fogo
Pálido e outros. Shapiro, também nascido na Rússia, é professor da
Cornell University, nos EUA, onde Nabokov se radicou e deu aulas nos
anos 40 e 50 [...] Não é por acaso que os dois autores estão entre os
poucos do século 20 que realmente podem ser chamados de estilistas[...]
Às vezes Proust, que cultivou uma linguagem preciosa sem ser
preciosista (ao contrário de Nabokov, que abusa de efeitos afetados),
não precisava de mais que um substantivo e um adjetivo para nos
traduzir uma imagem [...] Nabokov, apesar de ser rotulado como
pós-moderno por tantos analistas, gostava mesmo era dos grandes
mestres. Como Proust, não tirava da tela interior Botticelli, El Greco,
Rembrandt, Jan Van Eyck. Graviel Shapiro faz um paralelo entre ambos
logo no segundo capítulo:"Proust emprega a arte não tanto para
propósitos didáticos, mas sobretudo para partilhar uma impressão, para
evocar uma associação (...). Assim, por exemplo, Proust demonstra a
dúbia tentativa de Swann de introduzir Odette, sua amante filistina,
inculta, mais tarde sua esposa, (...) ligando sua imagem à pintura
florentina, particularmente a Botticelli." Nabokov, por sua vez,
trabalha com referências e alusões em nome do que Shapiro chama de
"presença autoral". Como Joyce, ele usa a pintura para falar da posição
do autor, de sua relação com o mundo, e por isso sempre inclui a si
mesmo na narrativa.
Shapiro também relaciona as remissões de Nabokov ao expressionismo
alemão, de artistas como Grosz, Beckmann e Dix, tema do último capítulo
[...]
[JM:
One comment I'd like to add to his article:
Shapiro compared Proust's use of Botticelli , in
connection with Odette, to Nabokov's references to the florentine
paintings ( Lolita is compared to SB's russet Venus, also in Ada he
returns to Botticelli and even in his forthcoming book, Flora, we might
find another reference to this particular mythological image). I hadn't
realized that Nabokov's russet not only introduced the reader to
Botticelli but, equally, to Proust's "Recherche" and Odette.]